Música e Beleza
Retomando depois de um longo período de recesso, o blog "Piano de Todos" volta a publicar novas postagens, só que agora valendo-se de uma perspectiva mais acadêmica.
Acreditando ser de grande proveito para os que ainda mantiveram suas visitas, esta nova postagem abordará a importância da Música em relação ao Belo.
É certo que todos nós pianistas amantes da Música, estamos disposto a ouvir ou não determinadas peças, conforme estas nos agrada e conforme dizemos encontrar nelas maior beleza.
Mas como isso se dá? Como é possível julgar que uma música é mais bonita do que outra música?
É diante destas curiosas indagações que exponho trechos de um artigo interessantíssimo, que visa responde-las.
Música e Beleza
Orlando Fedeli
II - Proporção e beleza
Não há quem não conheça o drama vivido por Cyrano de Bergerac, o herói imortalizado nos versos de Rostand. Cyrano era fisicamente feio: seu nariz era demasiado grande para seu rosto, isto é, era desproporcionado. Em qualquer época, em qualquer lugar que tivesse vivido, Cyrano seria conhecido por seu nariz... e por seu "panache". Pelo nariz, ele seria materialmente feio, e pelo "panache" de sua alma, seria belo. Era a desproporção do nariz que tornava Cyrano feio. Logo, feio é o que é desproporcionado. Belo é o que tem proporção.
Ora, a proporção é uma igualdade de duas razões:
a / b = c / d ou 1 / 2 = 3 / 6
A proporção é um valor matemático, objetivo e universal. Ela não depende nem de nós, nem do tempo, nem do lugar. A relação 1/2 = 3/6 é verdadeira não porque alguém ache, mas porque ambas as divisões, 1/2 e 3/6, são iguais a 0,5.
Mas, se a beleza depende da proporção e esta é objetiva, então a beleza também o é. Algo é belo porque tem proporções e não porque alguém o considere como tal.
Portanto, a beleza material é objetiva porque depende das proporções e das medidas, isto é, dos números.
Os grandes descobridores das proporções como causa da beleza material foram os gregos. Na arte grega tudo era medido, tudo era proporcionado.
Na arquitetura, todas as medidas dos edifícios gregos eram múltiplas e submúltiplas do diâmetro médio da coluna. Na escultura, as estátuas eram feitas tendo por módulo a cabeça. Foram os helenos que primeiro descobriram as admiráveis proporções com que Deus criou o homem. Em todas as artes, os gregos tiveram essa preocupação com a medida, com as proporções e com os números.
Os gregos não foram só grandes artistas, mas também grandes filósofos. Se a beleza material provém das medidas proporcionais, isto é, dos números, perguntavam-se eles: - Por que as proporções são belas?
O primeiro filósofo a tratar das relações entre a beleza e os números foi Pitágoras, e sua influência se estendeu, através de Platão e dos neo-platônicos, por longos séculos. Santo Agostinho e Boécio foram os transmissores dessa concepção numérica de beleza, nos primeiros tempos da Idade Média.
No livro "De Institutione Musica" (I, 10), Boécio narra uma antiga lenda sobre como Pitágoras teria descoberto a relação entre os números, a beleza e a música.
Diz ele que Pitágoras, passando um dia perto de uma forja, percebeu que os martelos, golpeando a bigorna, produziam sons harmoniosos. A princípio, julgou que a causa estava na força com que os ferreiros batiam os martelos. Para verificar se isto era certo, fez com que eles trocassem os martelos entre si. Percebeu, então, que os sons continuavam sendo harmoniosos. Portanto, a causa da beleza não estava na força dos ferreiros. Pesou, então, os vários martelos e verificou que eles tinham pesos tais, que era possível formar entre eles uma proporção. Os pesos dos martelos eram 12, 9, 8 e 6, e assim era possível montar a seguinte proporção:
6 / 8 = 9 / 12
E diz Boécio: "Os martelos que tinham pesos 12 e 6 ressoavam uma harmonia em "dobro". O martelo (que pesava) 12 com o (que pesava) 9, assim como o martelo (de peso) 8 com o (de peso) 6 se uniam com uma harmonia "diatessaron", segundo proporção epítrita; o 9, porém, com o 6, e o 12 com o 8 ressoavam o tom em proporção "sesquioitava" (Boécio, "De Institutione Musica", Ed. Teub., 1857, p. 196, 197, 198).
Em outros termos, os martelos que pesavam 12 e 6, golpeando, produziam a oitava. Os que tinham peso 12 e 9, ou 8 e 6 produziam a quarta. Entre o de peso 9 e o de peso 8 havia um tom inteiro. Com efeito, em número de vibrações duplas por segundo, as proporções entre os diversos sons naturais são:
DO 9/8 RÉ 10/9 MI 16/15 FA 9/8 SOL 10/9 LA 9/8 SI 16/15
Por exemplo, supondo que o DO fosse produzido por 24 vibrações duplas por segundo, as demais notas teriam os seguintes números de vibrações:
DO=24; RÉ=27; MI=30; FÁ=32; SOL=36; LÁ=40; SI=45; DO=48
A oitava, isto é, de DO a DO, corresponde o dobro de vibrações por segundo. Chama-se quinta o intervalo equivalente a 3/2 (de DO a SOL, 3/2). Quarta é o nome do intervalo de DO a FÁ e corresponde a 4/3. Tom é o intervalo de DO a RÉ, por exemplo, e corresponde a 9/8.
Os sons agradáveis ao ouvido correspondem a números proporcionados, e esses números e proporções seriam a causa da beleza musical. Quanto mais a relação numérica é simples, mais harmonioso é o intervalo, mais facilmente o ouvido capta a harmonia, e mais rapidamente a razão a compreende.
As harmonias fundamentais, resultantes de relações que são as mais simples e mais facilmemte perceptíveis, são o dobro, o triplo, o quádruplo, a unidade mais a metade (1+1/2 = 3/2), isto é, o intervalo de quinta, a unidade mais o terço (1+1/3 = 4/3), isto é, a relação de quarta.
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Para continuar a ler na integra visite :Fedeli, Orlando - "Música e Beleza"
MONTFORT Associação Culturalhttp://www.montfort.org.br/index.php?secao=cadernos&subsecao=arte&artigo=musicabeleza&lang=bra
Online, 19/08/2015 às 11:05h
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